Esses dias eu estava observando meus gatos, o Machado, o macho, ele é muito esperto, somente com tentativa e erro, ele aprendeu a abrir a maçaneta da porta, entrar nos quartos, e perturbar o meu sono. Por outro lado, minha outra gata, a Bitita, não conseguiu aprender com a descoberta do Machado. É como se eles não conseguissem se comunicar.
Já nós humanos aprendemos com a realidade, e não apenas isso: livros, músicas, paisagens, relacionamentos, inimigos, sei lá, aprendemos com qualquer coisa.
Mas nós só aprendemos aquilo que queremos aprender.
Imagine se você desejasse tanto ser policial, começar a ler romances de policiais, ficar tão imerso naquilo que um belo dia você se olha no espelho e vê a farda. Pega então uma faca e diz que é a sua pistola. Loucura, não é?
Você então começa sair para a rua, procurando crimes para desvendar, inocentes para proteger, e bandidos e ladrões para prender.
A realidade não está preparada para o seu novo nível de conhecimento. Você apanha. Todo mundo sabe que sua faca não é uma pistola, que sua roupa não é um uniforme. Que você não é um policial.
Mas você acredita. Se todos dissessem que você não é um policial e esse fosse o seu sonho, você lutaria com unhas e dentes contra todos os outros?
Sua família se preocupa com você, observa ver você chegando todos os dias, com diversos machucados, teimando e gritando que é um policial. Sua irmã descobre que você estava lendo diversos romances policiais, e ela tem certeza que a culpa é deles. Ela organiza uma fogueira e coloca fogo em tudo.
Isso não seria censura? Os romances de policiais realmente causaram tanta loucura na sua cabeça? Você escutaria sua família? Sua irmã? Ou se revoltaria contra todos eles?
Isso que narrei é a história do Dom Quixote, o fidalgo que lê tantos livros de cavalaria que se acha um cavaleiro.
Ele não se importa com nada, tem completa certeza daquilo que estudou, e tudo é tão forte, que tem aquela clássica batalha contra os moinhos de vento, mas que na cabeça dele são gigantes.
Ele se arrebenta todo, cai, mas continua, segue em frente, mesmo que tudo indique o contrário, ainda assim, ele acredita nas linhas que ele leu.
É uma linha tênue de beleza de não desistir, e teimosia que te machuca.
Hoje em dia não são mais os romances que influenciam as pessoas, vivemos então na era dos influencers, e talvez nunca antes na história houve tantos cavaleiros como existe hoje. Todos sentados no conforto de seus lares, com seus smartphones que são suas espadas, protegem suas ideologias e enfrentam diversos moinhos.
Mas nós somos diferentes, não somos? Se você leu até aqui eu sei que somos, mas mesmo assim precisamos vigiar, e termos cuidado para não sermos cavaleiros.

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