#0034 Ninguém é especial porque todos são especiais

Quando se anda de moto, é como se você sempre estivesse a um passo da morte, o que é estranho, se você parar e pensar que para morrermos basta que estejamos vivos.

Então, pensar na morte se torna algo constante. Por isso, acho que faria bem, se pensássemos mais um pouquinho nela, afinal, talvez, seja a única certeza que todos temos, morreremos.

E se hoje fosse o meu dia? Teria deixado algo que me orgulho?

Minhas realizações diante de tudo são pífias. Só que uma realização extraordinária não é nada. Não importa. Como coloca muito bem, Clóvis de Barros Filho, em seu livro “A felicidade é inútil”. E o inútil pode ser tudo, menos extraordinário.

Mas quando nos sentimos especiais, não dá um quentinho na barriga? Uma vontade molhadinha no peito coberto de glória; eu sei que você também sente. Mas logo passa. Alguns de nós desejam a fama, ser amado por multidões, mas como ser amado assim se para amar é preciso conhecer? Conhecer quem você é de fato. Vem então aquele medo de que se nos conhecessem de fato, ninguém nos amaria. E assim não seríamos especiais para ninguém.

Nos esquecemos que existir nesse mundo é um singelo milagre. Na corrida dos espermatozoides vencemos. Somos especiais. Essa é a parte coaching do texto, todos são especiais e isso é uma verdade. Carregamos metade de nossas mães, e metade de nossos pais, somos eles, somos de partes deles, mas vivemos para nós, para o outro, para o mundo. Somos todos especiais, e isso é um paradoxo, pois se todos são especiais ninguém é especial.

Então para não vivermos diante desse paradoxo, nós definimos e escolhemos algumas pessoas e significamos as realizações delas como extraordinárias. Sim, meu amigo. Não há nada extraordinário no mundo. Tudo é ordinário. O significado do extraordinário é construído por mim, por ti, por nós. Mas encarar isso é ver a nossa insignificância diante de um mundo de 14 bilhões de anos. É mais fácil pensar que existe entre nós verdadeiros gênios, salvadores, deuses. Lembramos disso constantemente.

E acabamos esquecendo que nenhum ser humano produz algo sozinho, por isso nós somos seres sociáveis. Você pode contra-argumentar sobre uma produção artesanal, mas ele importou algum material, precisou comprar alimentos, precisou de ferramentas, e tudo isso foi a partir de outros humanos.

Tudo o que construímos não vem do nada, veio da base de outros humanos. Muitos desses humanos não sabemos o nome, não tiveram o reconhecimento extraordinário que imaginamos que eles deveriam ter. Carl Sagan já dizia que se você quer fazer algo novo, precisa começar construindo um novo universo.

Então, em algum grau o que a humanidade produz é humano, e cada ser humano conseguiu contribuir com algo para isso, cada um de nós. Cada ser humano ordinário contribuiu para as poucas realizações extraordinárias que a maior parte dos humanos usufrui.

Nesta lógica, tudo que é extraordinário partiu do ordinário.

Ser ordinário assim é algo a se orgulhar. Então, a resposta a pergunta seria, talvez nenhum legado, mas deixei tanto amor, que certamente, é um amor extraordinário.

Chegará um dia que nem a Terra vai existir, e toda essa conversa que estamos tendo não fará nenhum sentido, será como se nunca tivesse existido.

Mas algo de nós ainda existirá, nem que sejam os átomos que nos compõem, e quando isso acontecer, tudo voltará a ser ordinário.

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