#0037 Eu quero ler a história dos que não deram certo

Nós nos deparamos o tempo todo com histórias de sucesso. Aquela pessoa fantástica que venceu um concurso, correu atrás de seus sonhos e deu certo.

Mas e todos aqueles que tentaram e não conseguiram? Não estou falando dos que talvez não tivessem obstinação para ser artista. Falo dos que deram a vida para fazer a arte como se fossem escravos dessa decisão. É como se eles não tivessem tido escolha, e precisavam fazer aquilo para sobreviver. Falo deles. De todos eles que mesmo assim não foram o suficiente, foram enterrados, foram esquecidos.

Por exemplo, conheço o trabalho dessas duas grandes escritoras: Maria Firmino dos Reis e Maria Carolina de Jesus. Elas são geniais, mas é provável que você nunca tenha ouvido falar delas. Mas a obra delas, se você as ler um dia, não vai mais esquecer.

Maria Carolina de Jesus era uma catadora de lixo, quando um repórter foi fazer uma matéria e a encontrou junto aos seus diários. Ele, como um bom marketeiro, fez um grande lançamento, transformando num grande lixão, e fetichizando a pobreza e a falta de acesso a recursos mínimos.

Sendo positiva ou negativa esta ação, a consequência foi que o livro caiu no gosto da elite da época e se tornou um best-seller. A elite queria conhecer a história da favelada que largou tudo pelo sonho de ser escritora. Mas depois disso, deste sucesso inicial, ela ficou restrita a um ambiente acadêmico e você nem deve conhecê-la.

Já Maria Firmino dos Reis viveu num século em que a escravização de seres humanos era legal, no nosso país. Mas ela, mesmo sendo uma mulher negra, era livre, não apenas da escravização, como também de homens. Era professora de uma das primeiras escolas públicas do Brasil, sim, uma servidora do Estado.

Ela, além de ter publicado o primeiro romance escrito por uma mulher no Brasil, deve ter feito tanto por seus iguais, mas não temos acesso, não sabemos. Sua obra é incrível, sem dúvidas, uma das melhores do romantismo brasileiro. Mas por razões estruturais, caiu no esquecimento, sendo seu livro, por acaso, achado num sebo nos anos 1960, e graças a isso, podemos resgatar a sua memória.

Eu queria mais histórias dessas pessoas. Qual a vida depois de fracassar em seus sonhos? Sei o que sentem alguns, por eles terem escrito sobre sua vida, como Fernando Pessoa e Maria Carolina de Jesus, para eles a arte era maior que a própria glória.

Mesmo sem glória, recursos ou qualquer benefício em escrever: eu escrevo. E eu pergunto a você, qual é o fracasso em sua vida que você faria mesmo que não fizesse nenhum sentido?

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